A propósito da Musica Velha e do Zeca Afonso
Os acontecimentos históricos - e o facto de uma canção "Grândola Vila Morena" ter sido senha de uma Revolução é dado incontornável da nossa história nacional - levantam sempre grandes paixões, principalmente quando a poeira dos tempos ainda não assentou completamente.
Neste blog discute-se acaloradamente a ligação de Zeca Afonso a Grândola o que é natural:
Uns viveram o acontecimento, outros têm os arquivos mas não os mostram, outros vão dizendo umas mentirinhas mais ou menos inocentes para também ficarem no retrato, e outros dão palpites.
Uns importam-se com a verdade.
Outros interessa-lhe mais colher frutos para o seu partido, ou organização política ainda "viva" ou já "morta".
Outros finalmente põem-se em bicos de pés, agitando galões que não têm, na esperança de adquirir algum protagonismo.
Enfim,como diria um antigo primeiro-ministro, É a vida!
Nesta matéria apenas me move um objectivo: que a verdade não seja deturpada.Por isso, embora não tendo sido protagonista dos acontecimentos (tinha 10 anos e só viria morar para Grândola passados 5 anos)vou dar os dados que possuo sobre o assunto e que adquiri pelos seguintes meios: grande amizade pessoal com alguns dos principais intervenientes da Música Velha, conhecimento pessoal e amizade com Zeca Afonso, leitura de documentos e diversos livros sobre o grande Cantor e, pasme-se! a minha própria ligação à Música Velha.
Vamos aos factos:ZECA AFONSO CANTOU EM GRÂNDOLA PELA PRIMEIRA VEZ EM GRÂNDOLA NO DIA 17 DE MAIO DE 1964.
Nesse dia, que era um Domingo, Zeca Afonso conheceu o igualmente grande, CARLOS PAREDES, que também tinha sido convidado pela Direcção da Música Velha SMFOG, para abrilhantar os festejos do 52º aniversário da Sociedade.
Quem era a DIRECÇÂO da Música nesse ano de 1964:
Presidente: Edémio José Neto
Vice: José da Conceição
Tesoureiro: Fernando Nóbua
1º Secretário: Mário Varanda
2º Secretário: Victor Martins
Vogal: José Manuel Galvão
Director de Banda: Luís Careto
Assembleia Geral:
Presidente: Belarmino Rosa
Vice: Eduardo Correia
Supl. Joaquim Martinse Evaristo Romero
Conselho Fiscal:Presidente: Custódio Mateus e
António Bispo e
Miguel António Rodrigues (Miguel Veneno)
Embora a carta-convite, dirigida a Zeca Afonso, então professor em Faro, tenha sido assinada por JOSÉ DA CONCEIÇÃO, a honra directa pelo convite caberá a todos os nomes que nesse ano pertenciam aos corpos sociais da Música e ainda ao único grandolense que já conhecia e era amigo de Zeca: o HELDER COSTA, Homem do Teatro e também de muitas lides políticas.
A quem mais aprofundadamente queira conhecer a vida e a obra de Zeca Afonso e a sua passagem por Grândola, aconselho a leitura de um grande livro: "JOSÉ AFONSO - O ROSTO DA UTOPIA" do jornalista José António Salvador.
Este livro que decerto existe na nossa Biblioteca Municipal, conta em discurso directo do próprio Zeca o seu primeiro contacto com Grândola e a história da canção que imortalizou esta terra. Depois da sua leitura, estou certo que certas "fantasias" não terão mais razão para continuar a ser propaladas.Para terminar apenas um esclarecimento: alguém neste blog dizia que a Ivone Chinita é que tinha trazido Zeca Afonso a Grândola.
Apesar de eu ter sido grande amigo da Ivone e de hoje a continuar a admirar como Lutadora e Poeta, não posso deixar de esclarecer que a IVONE nada teve a ver com a primeira vinda de Zeca Afonso à Vila Morena.
E esclareço:A IVONE CHINITA em 1970, então com 21 anos, teve uma acção extraordinária na Música Velha.Batendo de porta em porta, juntou um grupo de moços, e pelo menos uma moça, que formaram uma Comissão Cultural na colectividade.
Julgo que a Ivone nunca foi sócia da Música, se estiver errado peço que me corrijam, mas esse facto não foi impeditivo de realizar um importante trabalho na sociedade.Para aqueles que não conheceram esse tempo de ditadura esclareço que as "Comissões Culturais" eram o meio que se utilizava para poder realizar determinadas actividades polícas e culturais, sem que dirctamente se envolvessem as Direcções dos clubes e das sociedades.(Em Grândola esse sistema foi utilizado a partir dos anos quarenta e cinquenta com a criação de "Bibliotecas" por acção de uma outra figura incontornável da nossa história política local: JOSÉ MARREIROS MENDONÇA, recentemente falecido.)
Mas voltando ao ano de 1970, recordo que essa Comissão Cultural, em que me integrei desde a primeira hora, começou por levar a efeito, entre outras, as seguintes actividades: Teatro (A farsa de Mestre Pathelin, de Moliére), Sessões de declamação de poesia, baseadas primeiro livro da Ivone "DIGO FOME", Exposições de Pintura (Costa Brites)e Gravura (Manuel Cabanas).Por motivos pessoais e profissionais Ivone regressou aos Açores, mas o "grupo de moços" que ela juntou, continuou!Por isso e também porque alguns de nós já tínham grandes convicções, e até militância política, a COMISSÃO CULTURAL continuou em actividade.
É então que Zeca Afonso volta a Grândola, canta o ADRIANO, o RUI MINGAS, é realizada uma Feira do Livro no então Jardim 28 de Maio.
São realizadas exposições e conferências (vem cá nessa altura o SARAMAGO)etc etc etc.Humildemente, mas com muito orgulho, posso dar o meu testemunho porque estive em todas essas actividades.Eu e muitos jovens. E novamente o JOSÉ DA CONCEIÇÂO E ANTÒNIO MANUEL que faziam a ponte com os artistas e os restantes convidados.
Foram tempos difíceis porque vivíamos em ditadura e cada realização era ostensivamente vigiada do exterior, pelo Chefe da PSP e pelo mais importante informador da PIDE local, que assinava os seus minuciosos relatórios com o pseudónimo MANUEL CUSTÓDIO, mas que na verdade era SOBRAL... Mas foram igualmente tempos muito gratificantes!porque havia muita camaradagem e estávamos convictos que estávamos do lado certo da barricada.Alguns, que não viveram nada disto "aconselham-me" a "ver, ouvir e calar".
Lamento mas não lhes posso fazer a vontade.Nunca foi de minha índole essa atitude.E na polémica em torno da Música Velha e de algumas fantasias que a longo dos tempos têm sido atiradas ao ar, volto a dizer: não vale a pena mentir.
A verdade basta e é mais do que suficiente motivo de orgulho para todos os que numa fase ou outra estiveram por dentro dos acontecimentos.
Quando há alguns anos uma Direcção, a respeito de um determinado acontecimento que levou à prisão 7 (sete)jovens músicos, concedeu uma entrevista e teve logo que afirmar que a banda tinha sido toda presa (22 elementos) e que os cavalos da GNR tinham entrado pela Sociedade,na verdade não estavam a engrandecer a Colectividade.Estavam a cair no ridículo.
Por isso tenham a santa paciência: não posso ver ouvir e calar!
JOSÉ HORTA
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Que fique claro que pessoalmente nada me move quanto ao sr. José Horta, o que não gosto de ver e ouvir são as critícas muito das vezes estéreis que já tenho lido e ouvido. No caso pessoal deste comentário concordo com ele praticamente na integra. Isto sim é um comentário simples e informativo. Isto é aquilo que defendo, porque ao contrário de um outro comentário exposto neste blog, se é coisa que eu não sou é estalinista, nem nada que se pareça. Sou pela verdade, pelas acções e pela coerência das ideias. Não sou de maledicências, sou até normalmente reservado na palavra, não no pensamento. e PASME-SE sou neste momento um indivíduo livre, porque não alinhado politicamente. Mantenho-me, isso sim, fiel aos princípios e doutrinoas que sempre defendi e continuo a defender. Fui sou e continuo a ser socialista e anti capitalista.
ResponderExcluirNunca por nunca alguém me ouvio, de moto próprio, a não ser por resposta, a criticar publicamente quem quer que seja. Já foi alvo de graves ofensas públicas, e preferi calar a responder.
Por fim direi que provavelmente, para alívio de alguns, se não de todos os leitores deste blog, este meu comentário acerca deste assunto é o ultímo que farei, par amim é assunto arrumado.
Vítor Santos
Em divagações pela internet encontrei por acaso esta notícia que inclui uma alusão a IVONE CHINITA, de quem tive a honra de ser amigo. Vem aqui também mencionada a minha pessoa numa exposição que foi por ela organizada em Grândola, em 1970, cuja ocorrência era de meu conhecimento e que constitui um ponto concreto do meu curriculum artístico, que muito me honra. Este cruzamento de factos acorda em mim as mais sensibilizadas recordações, dado que resulta de ums amizade que se tornou facto há já muitos anos, em clima do mais notável entusiasmo artístico-cultural. O conhecinemto de IVONE CHINITA e de SANTOS BARROS foi dos frutos mais proveitosos da minha passagem pelos Açores e é pena que a tragédia do seu desaparecimento no-los tenha roubado tão cedo. Os meus mais amistosos cumprimentos ao autor deste blog e seus visitantes e, a todos, votos de óptima saúde.
ResponderExcluirZé Horta ................fizeste-me recordar os bons momentos que passamos na SMFOG duma importância simplesmente maravilhosa .....tempos em que a politica existia por amor, por acreditar em algo que até poderia ser uma utupia ,mas garantidamente sem aqueles interesses que hoje existem e que cada vez mai se acentua naquilo a que chamamos "ser humano".
ResponderExcluirObrigado por me recordares estes momento que também passei contigo e outros amigos!
Álvaro Cordeiro